quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Crime e recursos



Naquele almoço a conversa recaiu sobre um tema já batido: os jovens que morreram na praia do Meco, levados pelo mar.
Alargou-se a conversa, até porque as sensibilidades eram várias, e falou-se também daqueles que arriscam a vida dos outros: pescadores e automobilistas. E alguém alvitrou que as penas de multa deveriam ser bem mais pesadas para aqueles que, à revelia das instruções das autoridades, avançam para situações de risco. No caso do mar, os custos das buscas e salvamentos são incomportáveis numa sociedade como a nossa.
Com uma certa dose de radicalismo, mas sincero na opinião, disse eu que esses casos, a serem punidos, não o deveriam ser com multas. Que há quem tenha dinheiro para as pagar e ficar a rir-se.
Por mim, e a verificar-se a infracção, seria pena de prisão efectiva – semanas ou meses – não remíveis a dinheiro. Que a privação de liberdade é igualitária nas condições económicas dos infractores.
E se as penas aplicadas pelos tribunais servem para que o infractor aprenda uma lição, umas semanas de prisão são bem mais eficazes que uma qualquer multa.
A resposta que ouvi deixou-me literalmente siderado! “Não há recursos para prender tanta gente”.
Ora batatas!
Não é importante que os criminosos ou infractores aprendam a não o fazer ou ser. O que conta, mesmo, é o custo da sua reintegração social. E, em não havendo recursos para tal, transforme-se o crime ou infracção em fonte de receita do estado.
Suponho que, na douta opinião de quem comigo partilhava a mesa, esta seja uma solução para baixar o deficit, reduzir a dívida pública e fazer regressar o país aos mercados.

Assim sendo, proponho de novo uma ideia antiga:
Actue-se em conformidade com lei e autuem-se todos os veículos que, ilegitimamente, estacionam nos passeios e passagens de peões, impedindo-lhes a sua livre e segura circulação.

Pelas contas que fiz, há uns dois ou três anos, uma única patrulha policial apeada, em Lisboa, renderia aos cofres do estado num ano a módica quantia de dez milhões de euros.

By me

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Exemplos



Era o primeiro do ano e eu vinha do almoço.
E estranhei o carro assim e aqui parado. Os quatro piscas ligados mas as luzes de emergência apagadas, bem arrumadinho mas vazio na passadeira semaforizada de uma importante via da cidade.
Olhei em redor. Talvez que tivesse havido um acidente, que o dia estava de chuviscos, e eles tivessem vindo tomar conta da ocorrência. Até onde a minha vista alcançava, nada se via.
Pensei que tivesse havido um qualquer problema numa loja, banco ou quejando e prestei mais atenção. Os bancos próximos ficam ali mesmo, na esquina, e as caixas automáticas estavam vazias. E nas ruas, onde sempre se junta gente em caso de alteração da ordem pública, todos caminhavam com ar tranquilo de quem está a viver o primeiro dia do ano.
Chateou-me o facto. Afinal, era exactamente nesse dia que entravam em vigor as novas alterações ao Código da Estrada. E, novidade, eram salientados os mais vulnerareis – gente com dificuldade de locomoção, crianças, peões, ciclistas – e o aumento das regras para a sua protecção. E um carro de polícia estacionado na passadeira de peões e de bicicletas…
Tirei a câmara do bolso e fiz o registo. Solitário, que quem por ele era responsável teimava em não estar por perto.
Anotei a matrícula do carro, a data e a hora (estas últimas supérfluas, que a câmara havia-as registado). Bem como o local, esquina da av. da República com a av. Duque de Ávila. E continuava sozinho.
Acendi um cigarro e lamentei não ter comigo os autocolantes de protesto e alerta. Já tenho poucos, mas este seria um excelente caso para os usar. Mesmo que os vidros estivessem molhados, reduzindo drasticamente a sua capacidade de aderência.
Estava eu a pensar tudo isto, e já o cigarro fumado, quando surgem os agentes. Sorridentes, como quase toda a gente na rua neste primeiro de Janeiro, traziam consigo um saco de papel do MacDonalds, cheio, que talvez contivesse os seus almoços. Ou de qualquer camarada a quem fossem entrega-lo.
Olharam para mim, que estava sozinho e especado no meio do largo passeio, câmara na mão, mochila nas costas e boné na cabeça, e algo disseram que os fez rir ainda mais. Talvez que uma referência ao Pai Natal.
E lá seguiram no seu carro, como se tudo estivesse bem e dentro das normas legais e convenientes.
O que não estava nada normal ou legal era que dois agentes da PSP, sem estarem em trabalho de emergência (almoço não conta) estacionassem o seu carro-patrulha – com a matrícula 58-CN-46 – no mesmo local em que, noutras condições, haveriam de multar um qualquer civil.

A posse de farda, crachá e arma não dá direito a infringir a lei, seja ela qual for. E quando os exemplos de cumprir a lei não são dados por eles, como o podem exigir aos demais?

By me